4 amostras daquele objeto ainda chamado disco

Série de mini-resenhas que venho publicando no Instagram, sobre discos físicos que chegam pelo correio ou pelas mãos dos artistas nas andanças culturais da vida. Não importa a mídia (há tantas possibilidades!), mas a conexão e a oportunidade de se sensibilizar por meio da música.

Nino - Navegar nesse mistério

Receber discos na mão, durante esta fase de transição midiática que vivemos, é um grande prazer. Estes dias o compositor Felipe Prestes (Nino) me endereçou seu primeiro álbum solo, “Navegar nesse mistério”. Já havia escutado em formato digital e agora posso acompanhar suas letras críticas no encarte em papel.

Botar o CD pra tocar "no som" combina com o clima retrô das canções. Tem ecos de Belchior e Raul Seixas, num canto meio falado que deseja passar um recado. Quem for ouvir nas plataformas de streaming também vai perceber o tom eclético e oracular do álbum. Um lançamento sintonizado com o seu tempo, sem rupturas radicais, na passagem entre algo que ainda existe mas não é mais igual e algo que já se materializou mas não temos certeza onde vai dar.

Feito o comentário, agora posso colecionar esse item, colocando ao lado de tantos outros CDs de artistas independentes que enchem de colorido a estante e o espectro diverso da música brasileira.

Leandro Maia - Palavreio

Não é lançamento, pois ganhou o mundo em 2008, com financiamento do Fumproarte e um time luxuoso de músicos participando, sob produção de Pedrinho Figueiredo. Recebi o álbum "Palavreio" recentemente das mãos do próprio compositor, com uma dedicatória e um abraço fraterno.

É de um capricho o projeto gráfico do CD! Tem ilustrações de Jorge Hermann, um livreto tamanho pocket com as letras e outros poemas, e tem um elástico que agarra tudo num pequeno pacote.

Já era fã de Leandro Maia pela epopeia musical "Suíte Maria Bonita", lançada em 2014. Voltando um pouco no tempo com este álbum de dez anos atrás, fiquei abismado com sua força produtiva, percebendo que vem de tempos mais estreantes. A resolução e concepção artísticas de "Palavreio" impressionam. Desde aquelas poucas centenas de gramas de papel e plástico, passando por cada um dos versos e compassos dos arranjos. Leandro Maia agrega gente boa e inumeráveis referências num recorte regional de sotaque erudito. Tudo para apresentar o objeto primordial de sua produção: a canção.

Doidivanas - Próximos distantes

O xirú Rodrigo dMart foi quem trouxe o CD aqui em casa às vésperas de uma viagem que eu faria. Disse-me: “Ch’, bota na mala aí os Doidivanas que acabamos de gravar. Tem inclusive uma faixa sob medida pra te acompanhar no hemisfério norte: On the road”. Dois anos depois, posso dizer que seria a trilha perfeita, uma balada/milonga que fala sobre idas e vindas, projeções e memórias afetivas. Genial. Mas naqueles idos de 2017, confesso ao compositor e baterista da banda que o disco “Próximos distantes” não coube na bagagem, cheia de espaços para acomodar o desconhecido.

Desde que voltei ao Brasil, ao aconchego, passei a namorar na estante aquela capa branca tão bem ilustrada com um emaranhado de conexões. Até que recentemente avancei uma base em nossa relação platônica e botei pra rolar o som. Houve paixão à primeira escutada, pela canção trovadoresca “75”. Uma empolgante e inspiradora colagem de referências das culturas pop e regional, enunciadas em versos de rima ancestral.

O CD inteiro conjuga universos, e assinala um forte nó nos enredamentos da cultura contemporânea. Situada em Pelotas, a banda Doidivanas tarrafeia estas águas há pelo menos duas décadas. Em sincronia com Engenheiros do Hawaii e Graforreia Xilarmônica, vieram experimentando um pop-rock de sotaque acentuado, desde o primeiro álbum, até chegar a falar uma língua, um dialeto musical próprio, chamado doidivanês.

Érico Moura - Amaré

Na caixinha do correio, estava um envelope pardo com selos coloridos. O peso não era de carta, mas de encomenda. Abri e estavam ali o novo disco do compositor Érico Moura e uma mensagem escrita de próprio punho em papel manteiga. Não hesitei em ouvir logo e vou contar pra vocês minhas primeiras impressões.

O marcante em "Amaré" são as levadas pop, mescladas com climas alternativos. Letras confessionais e crônicas do cotidiano. A voz de Érico Moura tem uma característica, daquelas que dizemos no senso comum, sentindo uma empatia imediata: “que voz gostosa”.

É o segundo disco do compositor, após 12 anos da estreia. Conta com uma excelente banda base, de guitarra, baixo e bateria (com Lorenzo Flach, Diego Lopes e Bruno Neves). Tem um quê do paranaense Bruno Moraes, nos arranjos cool de metais e no timbre da voz, e outro quê do paulista Romulo Fróes, na invenção de melodias tortas que mantêm a dicção clara das letras. São dois compositores que admiro bastante e que gostei de poder associá-los nessa audição. Destaque para as faixas “A brisa e a maré”, “Um gole de azar” e “Gravamor”. Também adorei a arte do encarte do CD, assinada pelo artista Guilherme Dable.

No final da carta, Érico deixou um convite (dia 16 de janeiro tem show no Gravador Pub) e uma notícia boa (está preparando o terceiro disco para 2020). Quanto carinho e quanta atualização via correio! Vai aqui um abraço virtual pra ti, Érico.

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Uma publicação compartilhada por Joao Vicente Ribas (@pampurbana) em 1 de Dez, 2019 às 5:12 PST