A América Latina é mais América Latina com Sofía Viola

Sinto tanto por não ter ido ver o show da argentina Sofía Viola no festival El Mapa de Todos, em maio passado em Porto Alegre. Depois disso, não parei mais de ouvir o disco La Huella en el Cemento (2018).

Em meio a uma ótima e atual coleção de homens cancionistas, como o consagrado uruguaio Jorge Drexler, a revelação mexicana El David Aguilar, ou os populares argentinos Raly Barrionuevo e Lisandro Aristimuño, que lançaram juntos o projeto Hermano Hormiga, ou ainda o mister folk'n'roll Kevin Johansen, começam a despontar cada vez mais mulheres cantoras-compositoras na América Latina. Segue a tradição de grandes intérpretes, como Mercedes Sosa. Mas revelam-se cada vez mais cancionistas na senda de Violeta Parra, como a uruguaia Ana Prada, a chilena Mon Laferte e a mexicana Natalia Lafourcade.

Na Argentina, então, Sofía Viola é uma muito bem-vinda exceção em uma música muito marcada por bandas de rock masculinas, compositores homens e mulheres de vozes marcantes mas que atuam apenas como intérpretes. Pois as canções gravadas e performatizadas por Viola trazem não apenas uma voz forte e original, mas uma voz que diz o que pensa. Escreve de próprio punho. Sofía Viola tem uma voz! 🗣️🎙️

Falando em voz, seu cantar é eclético. Recorre a emissões fortes, ora quase guturais, ora de sotaque folclórico, com punch. Na faixa Stracualursi, uma bela amostra de técnica e talento interpretativo. Também sabe passear suave, como na bossinha queridona Ahorita.

Punch autóctone!
Minha faixa favorita tem sido nos últimos dias a narrativa andina Con Gaspar al mar. O verso abaixo, quase no desfecho da canção, é um misto de drama e resignação que me encanta:

No les puedo contar lo que pasó a Gaspar!
Le cortaron la cabeza y la tiraron al mar.
No quiero imaginar lo que mi me va a pasar!
La vida es aburrida con él y sin Gaspar

Contando histórias, a cancionista argentina tem rodado o mundo. Na semana passada, levou seu charango para soar na capital estadunidense, participando de mais um festival, o Atlas Presents Jazz.

Sinto tanto por ter perdido o show de Sofía Viola no El Mapa de Todos. Ainda assim, agradeço ao curador Fernando Rosa por trazer esta energia da natureza para imprimir em nosso cimento uma pegada que exala perfume de chimichurri, suor, ayahuasca, banana, batom e da flor metálica de Buenos Aires.

A América Latina é mais América Latina com Sofía Viola.


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