O Borogodó dos Cafundó no rincão dos Beatles

Nelson, Bebeto, Villeroy e Gelson
Eleanor Rigby sentou-se sozinha no mezanino do Sargent Peppers em Porto Alegre. Foi no último dia da temporada de janeiro. Atrasasse mais uma semana, colheria o arroz no chão da igreja. Desta vez, conseguiu assistir ao imperdível retorno do quarteto gaúcho, formado por Antonio Villeroy, Bebeto Alves, Gelson Oliveira e Nelson Coelho de Castro. Foram mais de dez anos de espera. Nesse tempo, cada um deu continuidade a sua carreira solo, após a gravação de dois discos e muitos shows no Brasil e na Europa sob o nome Juntos.

A nova investida veio com outro título, bem mais propositivo: O Borogodó dos Cafundó. Lançaram um manifesto na internet para justificá-lo. Tal quarteto de Liverpool, compuseram uma música-tema. E receberam o público nas noites de verão, no pub temático predileto dos beatlemaníacos. Estaria disposta a plateia à histeria?

Alguns vieram de Penny Lane para o encerramento, após boa repercussão do início da temporada e da apresentação no Rio de Janeiro. Estavam ávidos pela salvação da lavoura, promessa de vida criativa nestas glebas. Queriam ouvir um quê (um borogodó) sui generis, daqui donde vivem estes quatro (nos cafundó).

Em reflexão de clima bem temperado, espalhada nas redes, Antonio Villeroy fornecia uma pista do porquê do nome. Para o compositor, “o Brasil é cheio de cafundós e, às vezes, devido à nossa posição geográfica, parece que nos encontramos em um desses rincões distantes, onde pesquisadores vêm em busca de aves e plantas raras, de bancos genéticos inesperados, que, talvez, tragam a cura para algum mal”. E seguia desenhando: “não é à toa que, nas religiões afro-brasileiras, a palavra milonga, que dá nome a um de nossos estilos musicais, signifique segredo, sincretismo, feitiço e, também, cura”. Hey Jude adorou.

Leia aqui o manifesto.

Música rolando, apresentaram repertório consagrado dos dois discos; reverenciaram a casa que os acolhia com uma cover dos anfitriões simbólicos; ainda divertiram a platéia com uma versão de Massachusetts dos Bee Gees, rebatizada como Rio Grande; e tocaram a tão esperada O Borogodó dos Cafundó. Com esta última, Dear Prudence ficou perplexa, não sabia o que pensar. Não entendia se era um baião ou um xote. Caipira ou sertanejo? Era evidente o sotaque nordestino e não se encontrava nada que fizesse referência ao sul. Blackbird também ficou confusa, sem reprovação, mas até satisfação.

No último show da temporada (28/01) no Sgt. Peppers, o quarteto cantou músicas que marcaram época, como Armadilha, Una Loca Tempestad e Povoado das Águas
Lady Madonna esperava uma música síntese que unisse os quatro gaúchos, um da fronteira (Bebeto Alves), um de São Gabriel (Antonio Villeroy), um da serra (Gelson Oliveira) e outro da capital (Nelson Coelho de Castro). - Tipo algo bem gauchesco. Todavia, o quarteto surpreendeu e deixou a senhora desatendida.

Seria uma provocação um grupo do sul, de longa trajetória, representar-se com tons caipiras ou sertanejos? Não para Lucy in the Sky with Diamonds, que chegou atrasada, fez a volta no bar exalando seu perfume doce até encontrar as amigas numa mesa, cumprimentá-las com empolgação e papear o show inteiro.

Certamente, para a maioria da tripulação do Yellow Submarine, a escolha do ritmo e das rimas da canção foi só um detalhe. Deixaram-se levar pelo embalo irresistível de mais uma canção.

Uma dica para os leitores menos beatlemaníacos: clique no nome de cada canção para acessar as letras.

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